Defesa do contribuinte

  • Por: Amaury Rausch Mainenti OAB-MG nº 86.310
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Li há muito tempo atrás um artigo bem curioso, em que o articulista afirmava que somente advogados tributaristas é que sabem defender contribuintes.

A princípio, achei extremamente jactancioso o nobre articulista. Afinal, sendo oriundo da área contábil e atuando há tantos anos como auditor e perito judicial, sempre orientamos os nossos clientes de forma objetiva. Todavia, ao concluir o curso de Direito e iniciar as atividades na área tributária, nos vimos obrigados a concordar com essa assertiva.

Ora, certo é que o Estado tem o poder e o dever de fiscalizar os sujeitos passivos. Sem a fiscalização, certamente que não haveria o cumprimento das obrigações tributárias, particularmente quando se considera a realidade do País: alta carga tributária com recordes frequentes de arrecadação, e pouco ou quase nenhum retorno à coletividade. E o obrigado ao pagamento de tributo ou de penalidade pecuniária tem que estar ciente disso. Tem que encarar o poder de fiscalizar como algo normal, no âmbito da tributação. Até porque tais poderes já se encontram delineados nos arts. 194 e seguintes do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966).

Em nossa vida profissional já assistimos muitos empresários buscarem profissionais de outras áreas para fazer as suas defesas, talvez por não quererem arcar com o pagamento dos honorários de um profissional experiente, munido de ampla bagagem de experiência profissional, ou por não considerar importante uma autuação fiscal. E por isso encaminham tal obrigatoriedade para o profissional encarregado da contabilidade da empresa ou recorrem a algumas espécies de “milagreiros” ou “vendedores de facilidades”, quando não ex-auditores fiscais.

Em Direito Tributário não há milagres, tampouco facilidades.

Destacamos que não há qualquer demérito em relação ao papel do Contador, até porque somos graduados nessa ciência e atuamos na área. Mas certo é que no curso de Ciências Contábeis se aprende a aplicar a lei, e não a questionar a sua validade. Isso se aprende no curso de Direito ou após muitos estudos complementares.

Quanto aos “vendedores de facilidades”, também vemos que há, na maioria dos casos, justamente o indigitado “tráfico de influência”. E em se tratando de tributos, há leis claras que visam coibir a prática de ilícitos de natureza meramente administrativa ou crimes tributários. Todos já presenciaram situações em que quadrilhas montadas dentro dos órgãos fiscalizadores foram desbaratadas pelos profissionais integrantes dos órgãos vinculados à persecução penal no Brasil.

Reforçamos: em Direito Tributário não há milagres, tampouco facilidades.

Quanto aos ex-auditores – junto aos quais colacionamos de um sem número de amigos – sabemos que a formação dos mesmos é sempre pro fisco. Experimente levar ao conhecimento de uma autoridade tributária uma tese quanto ao pagamento ou não do tributo. É bem provável que esta desconsidere seus argumentos e pugne pelo recolhimento do tributo questionado. Como aconteceu com um de nossos clientes. Após apresentar ao auditor todos os fundamentos de fato e de direito aplicáveis ao caso, a autoridade sentenciou: “V. Sa. está certo, mas vou autuá-lo assim mesmo.” É algo surreal, mas aconteceu.

Não se pode desconsiderar, por uma questão de Justiça, os advogados generalistas, sem especialização suficiente para compreensão do fenômeno tributário suas correlações. Fomos contratados por uma empresa e, ao analisar uns embargos à execução proposto pelo antigo causídico, em uma ação cujo valor supera atualmente a casa dos dez milhões de reais, o mesmo praticamente “confessou” a dívida, tal a insubsistência da citada peça.

Enfim, no exercício desse poder de fiscalização o agente administrativo fazendário examina mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais dos comerciantes, industriais ou produtores, que se obrigam a apresentá-los ao Fisco, bem como conservá-los adequadamente, até que ocorra a prescrição dos créditos tributários decorrentes das operações a que se refiram. Podem ainda obter, mediante intimação escrita, informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros:

  • a) os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício;
  • b) bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas e demais instituições financeiras;
  • c) corretores, leiloeiros e despachantes oficiais;
  • d) os inventariantes;
  • e) os síndicos, comissários e liquidatários;
  • f) quaisquer outras entidades ou pessoas que a lei designar, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão (art. 197), excetuadas as informações em que o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo, em razão de cargo, função, ofício, ministério, atividade ou profissão (art. 197, § único).
  • g) Requerer o auxílio de força policial.
  • h) Prestar mútua assistência para a fiscalização dos tributos respectivos e permuta de informações, na forma estabelecida, em caráter geral ou específico, por lei ou convênio (art. 199).
  • i) Permutar informações (União) com Estados estrangeiros, na forma estabelecida em tratados, acordos ou convênios, no interesse da arrecadação e da fiscalização de tributos (art. 199, § único).

Há algumas discrepâncias entre o que a Lei Geral Tributária define e a conduta de alguns agentes de fiscalização. Tem sido muito comum se enviar intimações aos contribuintes para que estes elaborem planilhas ou preencham formulários complexos que, em função da natureza da atividade fiscalizatória, seriam atividades propriamente dos servidores públicos vinculados aos serviços de fiscalização. E o contribuinte que anui a essa ordem de coisas pode estar produzindo prova contra si mesmo, o que é vedado pela nossa Carta Magna e também é obrigação legal do fiscal, por força do disposto nos arts. 142 e seguintes do CTN.

Há muitos autos de infração forjados com base em “declarações” colhidas pelos agentes fiscais junto aos contribuintes, mediante coerção moral irresistível ou indução ao erro, sendo tratadas não raramente como confissões.

Isso sem falar nas “forças-tarefas”, em que se reúnem delegados, fiscais , procuradores e promotores, com a intenção manifesta de extrair do sujeito passivo uma declaração que em condições normais não o faria, ou anuir a parcelamentos de créditos tributários, muitas vezes revestidos de ilegalidades em sua formação.

Por isso, o sujeito passivo não pode permitir que se lhe turve o senso, quando submetido a um procedimento fiscalizatório. A cordialidade com os agentes fiscais é sempre bem vinda, é claro, mas isso não implica tornar-se um capacho da fiscalização e acatar quaisquer determinações que dali provenham. Para isso, pode contar com a atuação do advogado especializado, tanto no curso do processo de lançamento quanto para interpor os recursos administrativos ou judiciais cabíveis.

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